Senti-la (ser o veículo dela); escrevê-la, por e enquanto isso mesmo; e tornar a fazer ambas as coisas de cada vez que a concretiza. Et voilà le mystère! O Pessoa fala disso. E não só o Pessoa.
Joaquim Simões: Quanto de inspiração é trabalho? Aperfeiçoamento de uma técnica ao serviço das emoções de quem ouve e vê? Assalta-me sempre essa dúvida quanto à obra artística, principalmente nos grandes profissionais. Mesmo no jazz o improviso é construído antes, com treino, com estudo. A emoção fica por nossa conta pois, por vezes, o artista nem se emociona, de tanto repetir o acto.
Na escrita e nas artes plásticas, em que o artista constrói com tempo, com a razão, essa distância entre a obra e a emoção são ainda maiores. Na música e principalmente na improvisada, o tempo é o agora, e a emoção é a do momento e mesmo que se repita fica sempre alguma réstia de alma, inerente à audição de si próprio. Pat Metheny, quando questionado sobre se adaptava a sua música ao público respondia: Claro! O meu publico mais exigente sou eu. Toco principalmente para mim. Se o público gosta, melhor!
Sim, nas outras artes o processo criativo tem o tempo por sua conta, mas as sessões de jam servem também para experimentar arranjos, burilar combinações de notas e sequências que melhor resultam. Escrever de improviso e depois limpar, como dizia o Cardoso Pires (ele até usava o termo ‘desengordurar ’). Depois, é claro, nos espectáculos e gravações uma emoção nova dita um novo momento porque o processo está sempre em aberto, o que não acontece com o livro ou o quadro.
ML: mas as sessões de jam servem também para experimentar arranjos, burilar combinações de notas e sequências que melhor resultam
Um jazzman não diria melhor... :o)
O processo músical-cerebral está agora a ser descoberto de uma forma científica, através da nova tecnologia TAC funcional, que tem vindo a revelar que é um processo cognitivo diferente dos observados, quando o sujeito é submetido a outros estímulos. Daí que se sintam emoções específicas da experiência musical e que, por associação, nos levam a outras emoções obtidas por outros estímulos. Daí que a música nos faça viajar por outras imagens que são só nossas e por outras que são do foro colectivo veiculadas por uma cultura específica; ao escutarmos música japonesa sentimos de forma diferente que um japonês, no entanto a música de Grieg transporta-nos para uma paisagem bucólica em parte porque foi usada no audiovisual nesse contexto mas também porque na sua composição são usados elementos que a isso nos levam a associar. Para ilustrar a ideia : http://blue-breve.blogspot.com/2010/02/edvard-grieg-melodia-da-manha.html
6 comentários:
Senti-la (ser o veículo dela); escrevê-la, por e enquanto isso mesmo; e tornar a fazer ambas as coisas de cada vez que a concretiza.
Et voilà le mystère! O Pessoa fala disso. E não só o Pessoa.
Joaquim Simões:
Quanto de inspiração é trabalho? Aperfeiçoamento de uma técnica ao serviço das emoções de quem ouve e vê? Assalta-me sempre essa dúvida quanto à obra artística, principalmente nos grandes profissionais. Mesmo no jazz o improviso é construído antes, com treino, com estudo. A emoção fica por nossa conta pois, por vezes, o artista nem se emociona, de tanto repetir o acto.
E assim na música como nas outras artes. O José Cardoso Pires dizia que, com ele, um texto era um décimo de inspiração e nove décimos de limpeza.
Na escrita e nas artes plásticas, em que o artista constrói com tempo, com a razão, essa distância entre a obra e a emoção são ainda maiores. Na música e principalmente na improvisada, o tempo é o agora, e a emoção é a do momento e mesmo que se repita fica sempre alguma réstia de alma, inerente à audição de si próprio. Pat Metheny, quando questionado sobre se adaptava a sua música ao público respondia: Claro! O meu publico mais exigente sou eu. Toco principalmente para mim. Se o público gosta, melhor!
Sim, nas outras artes o processo criativo tem o tempo por sua conta, mas as sessões de jam servem também para experimentar arranjos, burilar combinações de notas e sequências que melhor resultam. Escrever de improviso e depois limpar, como dizia o Cardoso Pires (ele até usava o termo ‘desengordurar ’).
Depois, é claro, nos espectáculos e gravações uma emoção nova dita um novo momento porque o processo está sempre em aberto, o que não acontece com o livro ou o quadro.
ML:
mas as sessões de jam servem também para experimentar arranjos, burilar combinações de notas e sequências que melhor resultam
Um jazzman não diria melhor... :o)
O processo músical-cerebral está agora a ser descoberto de uma forma científica, através da nova tecnologia TAC funcional, que tem vindo a revelar que é um processo cognitivo diferente dos observados, quando o sujeito é submetido a outros estímulos. Daí que se sintam emoções específicas da experiência musical e que, por associação, nos levam a outras emoções obtidas por outros estímulos. Daí que a música nos faça viajar por outras imagens que são só nossas e por outras que são do foro colectivo veiculadas por uma cultura específica; ao escutarmos música japonesa sentimos de forma diferente que um japonês, no entanto a música de Grieg transporta-nos para uma paisagem bucólica em parte porque foi usada no audiovisual nesse contexto mas também porque na sua composição são usados elementos que a isso nos levam a associar.
Para ilustrar a ideia :
http://blue-breve.blogspot.com/2010/02/edvard-grieg-melodia-da-manha.html
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